Saudosa Saudade

30 de Janeiro , Dia da Saudade

BLOGESCRITAS

1/29/20251 min read

A saudade sauda tudo aquilo que carregamos na lembrança. Somos feitos de saudades. Sinto falta de muitas coisas e isso não significa que me traga tristeza ou algo melancólico. Existem saudades que são calma, aconchego. Outras saudades são cortantes e nos fatiam por inteiro. Muitas das saudades que habitam em mim são as saudosas alegrias vividas.

Hoje chupando laranja pós almoço, me veio uma saudade. Saudade da minha avó descascando laranja, sentada com seu avental sujo do preparo do almoço, com uma faca na mão e um prato transparente no colo.
O ato de sentar com suas netas em sua volta, na beira da escada do quintal e descascar laranjas, num corte único e artístico, sem quebrar a casca, era um aconchego. Suas cascas perfumadas em formato de mola, era brincadeira para nós.

Minha mãe guarda uma lembrança curiosa deste momento também. Ela, depois de chupar a laranja inteirinha, pegava o bagaço, que lembra uma saia rodada, e dançava com as mãos fingindo ser uma bailarina.

Esse ritual de descascar laranjas era silencioso e representava quase que uma reconciliação do nosso alvoroço pueril. Havia amor material naquela laranja. Talvez essa fosse a forma que ela encontrou de descansar de si e de se conectar com ela mesma, mas também de falar “eu te amo”.

Esta é uma das poucas lembranças que tenho da minha avó em paz, vulnerável. Um dia ouvi “Eu me sinto como uma laranja descascada”. Descascar é retirar a sua proteção, é estar pele a pele, descoberta de armaduras. Ali, naquele ato doce e simples, estávamos sendo amadas por um amor gentil e altruísta.

Saudades de um quintal e uma laranja descascada.